Nova Delta, CEI by Zipor, Norauto, Auchan, Simarsul e 2GoOutConsulting foram as primeiras empresas em Portugal com sistemas produtivos ou profissionais certificados em economia circular, mediante uma escala classificativa semelhante à que atesta a eficiência energética dos eletrodomésticos.
Segundo revelaram hoje três dessas entidades, o novo processo de certificação chama-se eCircular e é tutelado pela ADENE – Agência para a Energia, que desenvolveu a nova metodologia com 40 organizações portuguesas de vários setores, para definição de um sistema de medição de circularidade “universal, abrangente e rigoroso”.
Em declarações à Lusa, o administrador do Grupo Nabeiro – Delta Cafés, Ivan Nabeiro, explicou que “este sistema de classificação do desempenho em economia circular fornece um conjunto estruturado de diretrizes e métricas de avaliação específicas e transparentes, que tornam as práticas e os resultados mensuráveis, reduzindo assim margem para situações de ‘greenwashing’[ato de declarar algo como trazendo benefícios para o ambiente quando esse impacto não existe]”.
Salientando que, ao ser realizada por profissionais independentes, a auditoria reforça a consciencialização coletiva para as questões da sustentabilidade e para a necessidade de empresas e líderes adotarem “práticas consideradas regenerativas”, o administrador deu exemplos de algumas medidas que contribuíram para que a Delta obtivesse a classe A – a mais eficiente em circularidade, à semelhança da escala relativa ao desempenho energético de eletrodomésticos.
“Estamos a reestruturar processos, produtos e serviços, de forma a promover um uso responsável do plástico, e, na cadeia de fornecimento sustentável, através de estreita colaboração com diferentes parceiros, avaliamos desde a aquisição das matérias-primas até ao fim de vida do produto”, referiu.
Ivan Nabeiro destacou ainda “o projeto de economia circular da Delta Cafés e da startup Nãm, que, criado em plena cidade de Lisboa, faz a recolha controlada e certificada da borra de café Delta e a utiliza para a produção sustentável e consciente de cogumelos”.
Pedro Fonseca Santos, fundador da 2GoOutConsulting e agora um dos primeiros auditores independentes habilitados a avaliar o grau de circularidade de uma organização, afirmou: “o que esta certificação tem de importante é que demonstra que agora há um sistema de classificação que permite avaliar e medir o nível efetivo de economia circular das empresas, tal como já acontecia com a eficiência energética de um edifício ou de um eletrodoméstico, com aquela escala de cores que vai do A ao F”.
Álvaro Gouveia é o administrador da CEI by Zipor, que fabrica equipamentos para a indústria de rochas ornamentais, e admitiu que o processo de certificação pode ser difícil porque implica verificar vários domínios de atuação dentro de cada empresa – “água, materiais e resíduos, energia, ciclo de vida do produto, etc.” – mas realçou que a circularidade vai tornar-se um critério cada vez mais importante no desempenho do setor produtivo.
“Sujeitarmo-nos ao processo de certificação é uma opção totalmente voluntária, mas o facto é que há muitas empresas a fazer ‘greenwahsing’ – a apregoar práticas ambientais que, na realidade, não funcionam ou nem sequer existem – e isto é útil para separar o trigo do joio. Até os bancos vão apertar cada vez mais a malha e começar a só emprestar dinheiro a empresas com produtos sustentáveis”, alertou.
Pedro Fonseca Santos notou que essa estratégia de crescente exigência de sustentabilidade segue as “instruções do próprio Banco Central Europeu” e implicará analisar também, em cada organização, “o seu contributo para os fenómenos climáticos”, pelo que “mais vale antecipar a necessidade da certificação do que, depois, correr atrás do prejuízo”.
Álvaro Gouveia reconheceu que a consciência ambiental “obriga a um esforço de inovação constante”, implicando medidas como a substituição de materiais, a reformulação do catálogo de produtos e a melhoria digital dos processos industriais para garantia de menor desperdício.
Como esses ajustes ficam caros e isso se reflete no preço final do produto, um estímulo “útil” seria criar benefícios fiscais para quem mais se empenhar no processo. “Poderia fazer-se como na Alemanha, que está muito mais desenvolvida nesta questão da circularidade porque conta com sistemas de inventivo e tem taxas de juro mais baixas para quem adota práticas sustentáveis”, disse o administrador da CEI.
Se a “necessidade moral” de preservar o planeta não for suficiente, Pedro Fonseca Santos recomenda que se encare a economia circular como um negócio em si mesmo. “O esforço de adaptação até pode resultar em preços mais caros, mas o cliente estará disponível para os pagar se lhe souberem explicar muito bem o que justifica essa diferença de valor e porque é que ela é uma mais-valia”, concluiu.