Diretor do Observatório da Solidão defende novas abordagens ao envelhecimento 

O diretor do Observatório da Solidão, Adalberto Dias de Carvalho, considerou hoje que são “absolutamente necessárias” novas abordagens na resposta ao envelhecimento, indicando que haverá cada vez mais cidadãos centenários, numa sociedade que precisa de reconstruir “relações de vizinhança”.

“A velhice é uma das etapas da vida, não é apenas a pré-morte”, defendeu em entrevista à agência Lusa, advertindo que “é algo a que todos chegaremos”.

Professor catedrático aposentado da Universidade do Porto e doutorado em Filosofia, Adalberto Dias de Carvalho apontou que nas cidades, há sempre “um problema de anonimato” e que em contexto urbano se perdeu “algo muito importante”, as relações de vizinhança.

“É onde, aparentemente há mais instituições de apoio às pessoas, mas aí o vazio é muito grande,” referiu o académico.

A APRE – Associação de Reformados e Pensionistas sugeriu hoje uma intervenção das juntas de freguesia num levantamento das situações de solidão, referindo que em Coimbra as juntas desconhecem o número de idosos que vivem sós.

“É inaceitável que as juntas de freguesia ignorem os idosos que vivem na sua freguesia, é algo inaceitável e que tem de ser corrigido com toda a urgência. Também importa não ter da assistência social uma perspetiva de assistencialismo. Ao criar dependências e ao não criar mecanismos autónomos de funcionamento significa que, na ausência desse assistencialismo, as pessoas caem na solidão, no abandono”, alertou a associação.

“Será fundamental que as juntas de freguesia, pela proximidade com as populações – se não têm os meios suficientes para isso têm de os requerer, têm de os exigir – criem, com pessoal qualificado, com técnicos qualificados, as estruturas de que necessitam, para ajudarem as pessoas a construírem laços de vizinhança e isso tem de ser conseguido através dos assistentes sociais e dos mediadores sociais, das visitas que façam junto dos próprios, junto de familiares, de vizinhos”, explicou.

Na opinião do diretor do Observatório da Solidão, a assistência prestada por estes técnicos é e continuará a ser importante, mas “nunca poderá substitui-se ao quotidiano”, até porque não poderá haver um assistente social ou um médico “sempre presente”.

Em relação aos quase 3.000 centenários registados em Portugal, em 2022, sublinhou tratar-se de “uma realidade nova”.

“Sempre houve pessoas com 100 anos ou mais, mas a sua percentagem agora é um fenómeno típico dos países mais desenvolvidos”, disse, acrescentando que nas instituições de acolhimento são necessárias respostas diferenciadas para pessoas com 65 anos e 85 anos ou mais.

Questionado sobre os movimentos surgidos no meio artístico e académico contra o preconceito em função da idade e a imposição da reforma por limite etário (idadismo) Adalberto Dias de Carvalho referiu que nos Estados Unidos as pessoas continuam a trabalhar se estiverem capazes, mas que na Europa, uma medida criada por razões de ordem social, de proteção dos cidadãos, neste momento começa a ser “um constrangimento negativo”.

“Para já porque as pessoas, por razões de ordem médica, social, de convivialidade, permanecem com traços de juventude até mais tarde, até inclusivamente na forma de vestir, na forma de estar. As pessoas idosas, hoje em dia, vestem-se de uma forma muito próxima da juventude”, observou.

Da mesma forma, referiu, há uma parte da população sénior que faz desporto e turismo. “Em termos laborais, é evidente que uma boa parte dos nossos profissionais, na idade dos 65 e dos 70, estão perfeitamente aptos para continuar a trabalhar. Deveria haver a possibilidade de as pessoas se reformarem, mas não a obrigatoriedade”, advogou.

“Muitas das funções que uma pessoa mais idosa desempenha têm muito a ver com a experiência adquirida em função da idade”, sustentou o académico, referindo que nas universidades existem pessoas com “uma atividade intelectual fortíssima”, às quais não deveria ser imposta a reforma. “O que é preciso é que as instituições se organizem de forma a aproveitarem os contributos dos mais novos e dos mais velhos”, concluiu o investigador.