Um grupo de mulheres entregou um dossiê à Comissão Independente, criada pelo Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, a denunciar nove casos de assédio que terão ocorrido em projetos dirigidos por Boaventura de Sousa Santos.
“No dia 30 de setembro, apresentámos à Comissão Independente de esclarecimento de situações de assédio no CES um dossiê com 213 páginas, através do qual que é apresentado, com detalhe, um conjunto de situações de violência, que cabem nas categorias amplas de assédio sexual, assédio moral e extrativismo intelectual”, referiu o coletivo de mulheres numa carta enviada à agência Lusa.
Três investigadoras que passaram pelo CES da Universidade de Coimbra denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado “Má conduta sexual na Academia – Para uma Ética de Cuidado na Universidade”, o que levou a que os investigadores Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam naquela instituição.
O CES acabou por criar uma Comissão Independente, que iniciou funções a 01 de agosto e que estipulou que as denúncias de alegadas situações de assédio deveriam ser submetidas até 30 de setembro.
De acordo com o coletivo de mulheres, as nove denúncias enviadas à Comissão Independente reportam-se “a situações de assédio ocorridas em atividades, projetos ou grupos de pesquisa dirigidos por Boaventura de Sousa Santos”, o que inclui situações de “assédio moral e sexual praticado por este, como também por membros da sua equipa, a quem delegava poderes”.
Terão ocorrido “entre 2000 e 2023”, e dizem respeito a nove mulheres de Portugal, Brasil, Espanha, México e Peru.
“As autoras do artigo do livro não compõem este coletivo de mulheres. Estas são outras nove vítimas”, esclareceu a representante legal.
Na carta enviada à Lusa, o grupo de mulheres explicou que os relatos apresentados estão, em parte, apoiados “na memória de episódios que marcaram e traumatizaram” as alegadas vítimas.
“Solicitámos à Comissão [Independente] um trabalho criterioso na apuração dos factos e que tenha em conta a vulnerabilidade das vítimas no acesso a meios de provas. O ónus da prova não deve, em qualquer circunstância, recair sobre as partes vulneráveis, as vítimas”.
Apesar de admitirem a dificuldade na produção de provas, porque “o CES não promoveu mecanismos seguros e eficientes de apuração no tempo em que ocorreram as situações de assédio”, estas mulheres garantiram que o dossiê reúne “um conjunto razoável de elementos probatórios”.
“Indicamos, ainda, um conjunto alargado de testemunhas, que corroboram os relatos de todas as vítimas. Além disso, no momento da entrevista com a Comissão, iremos disponibilizar provas complementares”.
O coletivo de mulheres mostrou-se ainda convicto de que “existem mais vítimas, mais testemunhas, mais histórias de violência”, pelo que considerou “imprescindível que seja mantido aberto um espaço para acolher vítimas que possam decidir apresentar denúncias num outro momento”.
“O caráter sistemático das situações de abuso que denunciamos aponta para a necessidade de uma Comissão Independente que funcione por um tempo em modo permanente, promova investigações a fundo e permita às vítimas a possibilidade da denúncia e do acolhimento no momento em que se sentirem preparadas para o fazer”.
Contactada pela Lusa, a Comissão Independente informou que os seus membros “abster-se-ão de prestar declarações públicas no decorrer dos trabalhos e até à apresentação das suas conclusões”.
“Os resultados finais do processo serão comunicados publicamente até ao final do ano de 2023”, concluiu.